domingo, 28 de janeiro de 2007

Liberdade

Vez por outra nos percebemos inseguros,
tristes em não poder mudar um passado
desastrado, paralisados em mente e alma
e imersos numa devassidão permanente.

Consideramo-nos parte de um lixo fétido
e podre, incapazes de impedir sobrestar
o ritmo espontâneo de desenvolvimento
das habilidades mentais do ser humano.

Sim, somos a multiplicação de conceitos
e aforismos desassociados da realidade
romântica criada por nossos antepassados
e por nós aniquilada, como nuvem cósmica.

Somos também desavergonhados e feios,
quando nem nossa reputação poupamos de
enxovalhos desproporcionais à veracidade
outrora substancial, não exatamente agora.

Sobretudo, somos mesquinhos e ignorantes em
tratarmos o que de fato existe numa ilusão
constante e preponderante, sem dar azo à
verdade substancial que não nos rodeia.

Tratamos como bom aquilo que nos apetece
e como mau aquilo que nos ojeriza, ao passo
que não nos acontece saber o que agrada a
quem não nos conhece, ou quem não sabemos.

Delimitamos nosso pensar por linhas tortuosas e
sem fundamento social, distorcendo a verdade
e trazendo para nós a comoção moral de deuses
surreais de relação pérfida para com os mortais.

Brindemos as crianças e adultos espontâneos,
de paladar sincero e palavreado universal.
Esqueçamos os homens de meias-palavras que
escondem a vida em suspensórios antiquados.

Brindemos o luar eternizado por reais juras de
amor que jamais serão extraviadas ao limbo
de não mais querer aqueles que não têm mais.
Não brindemos a Pátria ou suas instituições.

Tratemos de valorizar o que de fato pode existir
ou existe, longe ou não dos olhos, perto ou não
do coração, para que não retardemos a sensação,
por culpa ou não, de livremente fugir deste lugar.

Não os enfrentemos por migalhas de sentimentos
pulverizados em pseudo-monopólios, que brindam
- esses sim - a hipocrisia d'uma serventia insalubre.
Sejamos nós noutros mesmos, eterna contemplação.

Para que saibam que nossa existência está muito
além desses imensos muros altos que sitiam nossa
liberdade: estamos e aqui vivemos atrás daquilo que
persiste, numa existência latente, robusta e infinita.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Clube da Lua (Luna de Avellaneda)
Argentina-Espanha, 2004
Direção: Juan José Campanella

sábado, 27 de janeiro de 2007

Sensação

Resta acima de tudo
essa sensação de ternura
essa sincera compaixão
esse carinho interminável

vindos de dentro, do fundo
oriundo da mistura de nós e
de você, de quando nos temos
ou até quando não nos vemos

uma ternura interminável
um carinho inestimável
uma compaixão indelével
que desvira sensação

quando deixa a compaixão
e explode de carinho - todo
carinho restante e bastante
- posto num único momento.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

O Haver, Vinícius de Moraes

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Queria muito dizer

Queria muito dizer,
que a vida não é triste não!
Vai de lado, vira curva,
segue repleta de emoção.

Queria muito dizer,
que nada é maçada!
Chora e pia - espia ela
fugindo pela estrada.

Queria muito dizer
que em meu ser
tudo está fadado
a ser amado, um
resultado, um ser
contabilizado.

Queria muito dizer
que por prazer quero
tudo ao meu lado,
sincronizado, um
bem não pardo,
deveras sensibilizado.

Queria muito dizer
que por amor
faço tudo sem pudor
e por temor
não faço nada.

Queria muito dizer
que com você, faço
tudo por querer
e sem lhe ter
não faço nada.

Queria muito dizer
que nessa vida não
há padrão, só o tesão
de ser vivida.

Queria muito dizer
sem precisar dizer
que amo muito, e
amiúde, percebo.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Is it a crime, Sade

segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

Viver poesia...

Viver poesia
é nadar no mar
despido
é comemorar
amigo
é silenciar
consigo.

O poeta se alimenta
de poesia, numa
adorável fantasia
d'ela querer, hoje
e todo dia, seu
conselho matinal.

Poderiam todos os velhacos
serem trocados por belas e
formosas poetisas, de amar
nesse mar de contemplação.

Enquanto a hora não chega
mantemo-nos fiel à poesia
fruto desse afeto múltiplo
dado por nós, em cortesia.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

O Poeta, Vinícius de Moraes

sábado, 20 de janeiro de 2007

Predileção tácita

Assim como uma alma penada
caminhamos por corações
alheios, nesta longa estrada
de infindáveis sensações.

Tal como beijamos meretrizes
também amamos e afagamos
fadas, que por nossas raízes
seriam nossas mães, amadas.

Nosso dever pode ser suturar
restos de corações, petrificados
por lágrimas de incompreensão

ou pode ser sentir e aniquilar
páginas e páginas de um romance
que nunca devia ter existido.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

"You've got such a pretty smile
It's a shame the things you hide behind it
Let 'em go, give it up, for a while
Let 'em free and we will both go find it"

I know, Jude

segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

Soneto de Perdição

Onde estão, Senhores
onde estão os Amores
de amar e se dar
de ver a terra rodar?

Onde estão, Profetas
todos os Poetas
que me fazem sonhar
de novo m'apaixonar?

Será que partiram
todos à perdição
de não mais amar?

Será mesmo que partiram
em cacos, meu coração
espatifado no ar?

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Amor de Perdição, Camilo Castelo Branco (1825-1890)

domingo, 7 de janeiro de 2007

Libertação

Não precisa mais almejado!
Próprio por quisto, sozinho
por querido, perder seus dias
em não pensar mais nisto.

Aos que a graça seja,
desgraça se construa.
Aos que a soberba possua,
conceba-lhes a morte.

E de tudo o mais, que
não conduza, para sua
própria liberdade,

sê inteiro, daquilo tudo que
lhe traduza, e não mais
despreze sua identidade.

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Quero ignorado, Fernando Pessoa

O mundo é um moinho, Cartola

sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

Solidão pretérita

Recolho-me à minha insuportável bolha
de não amar a todos, ou de não amar,
para celebrar o estado perfeito
da magnificência perante tudo.

As nuvens no céu, parcas e lotadas,
carregam todas as máculas pretéritas
:somos de novo deuses e magos e mestres,
autônomos de um presente, que não mais será!

E dentro de tão linda (e hermética!) bolha,
tenho comigo todos os sonhos do mundo,
os quais terei a árdua labuta
de decifrá-los e colocá-los presente.

Serão (serei?) de novo um conjugado
de idéias esparsas, de caráter epistemológico?
Ou seremos tudo e todos - e nós, convosco,
um só aglomerado de infindáveis sensações?

O passado foi e se mostrou inócuo,
carente de realizações consistentes;
resta-me um futuro que não existe
e um presente que é meu, só meu!

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Eu te amo, Chico Buarque e Daniela Mercury (1993)

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Um nada romântico

Ânimos exaltados, inanimados
voltas retangulares, milhares voltas
sensações de exaspero singular.
Estou de novo limpo, como quem
acordou amanhã, ou visitou os avós
no interior. De novo me quero bem,
como quem se cerca por protetor
solar, ou quando começa a amar,
paixão efêmera de alguém. Sinto-me
expressamente cuspido do limbo

renovado, com pudor adorado
olhar distante, prudente, enviesado
amante novamente de coisas tolas
ou consistentes ou sinceras, para que
possam também amar e querer bem
mesmo que não tenham ninguém para
amar e saturar de beijos atemporais e
carinhos anormais, justamente agora.

Expelido pela culatra, numa mistura de
sobras e cistos que determinam a vida
como uma ordem que maltrata o elo
entre corações pedintes de si e sós
por eles mesmos, acabo por ser
esse fétido engodo desproporcional
à dilatação espacial forçadamente
colocada em banho-maria, à margem.
Mas, quem será que tem tempo de poder
querer escolher carinhos e beijos e
lágrima e sensações a toda hora?

Rodrigo Sluminsky



+++ Etecetera

Nothing else matters, Metallica