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Imaginário

Por todos os motivos que levei anos para pensá-los Por todos os fatos que me deixaram uma vida inteira sem vivë-los Por todas as razões que censuram minha autonomia Eu continuarei sendo aquele que nunca foi de verdade. Rodrigo Sluminsky +++ Etecetera Vida e Obra de Jacques Lacan Take Five, George Benson

Aos que hesitam

Você diz: Nossa causa vai mal. A escuridão aumenta. As forças diminuem. Agora, depois que trabalhamos tanto tempo, Estamos em situação pior que no início. Mas o inimigo está mais forte do que nunca. Sua força parece ter crescido. Ficou com aparência de invencível. Mas nós cometemos erros, não há como negar. Nosso número se reduz. Nossas palavras de ordem estão em desordem. O inimigo distorceu muitas de nossas palavras, até ficarem irreconhecíveis. Daquilo que dissemos, o que agora é falso: tudo ou alguma coisa? Com quem contamos ainda? Somos o que restou, Lançados fora da corrente viva? Ficaremos para trás, por ninguém compreendidos e a ninguém compreendendo? Precisamos ter sorte? Isto você pergunta. Não espere nenhuma resposta senão a sua. Bertolt Brecht +++ Etecetera Antologia Poética de Bertolt Brecht Bertold Brecht (1898-1956)

Prefiro dizer que te amo

Qual será o derradeiro amor depois que todos amores se forem, quando não mais sentem a dor ou se importem em perdoar? Há tanto não se classifica aquilo, que é guardado em mim, escondido e mistificado, dentro do peito. Sentem o ócio de um ébrio ocupado em pensar as coisas que realmente importam, dizendo palavras não ouvidas, ouvindo palavras nunca ditas... Escolhas, Arre!, detesto-as, tanto quanto não amar meus amores ou dizer que os amo! Amo-te, sim, querida, assim como sempre te amei e sempre te desejei todinha para mim... Mesmo que os poréns insistam em censurar a pureza da nossa poligamia Ainda que tais poréns que nada esclarecem mergulham-te em iras irremediáveis e me façam no espelho cuspir! Rodrigo Sluminsky +++ Etecetera Itapema FM

A vida pelos olhos de quem (não) a vê

Cego eu nasci, chorando alto de madrugada depois de uma longa apartada com minha mãe toda escancarada; nasci sem saber nada desse mundo novo, sem conhecer as pessoas que me acolheriam, sem pronunciar uma só palavra de carinho, sem cabelos, sem cor, sem tato, sem poder distinguir uma pétala de rosa de um dente de alho, sem chorar por amor, sem conhecer a dor, sem pudor, ardor, temor; nasci sem mãe, sem pai, sem irmãos, sem escrúpulos de não enxergar o que não via à minha frente, sem coragem de enfrentar tudo que se passava pela minha mente. Jovem eu cresci, olhando tudo nas estradas andando torto pelas escadas beijando todas as namoradas; cresci sem saber que era órfão, sem estudo, sem religião, sem comida na boca, sem educação, sem rede para caçar borboletas, sem vara para pescar palombetas; cresci sem ódio no coração, sem anseio de vingar quem vivia de compaixão, sem capricho para matar minha constante comichão. Vidente eu morri, depois de uma noitada chorando por minha amada com minh...

Sinceridade de um ébrio amor

Amo tudo que meu coração aponta. Às vezes derradeiro amor, outrora infindável ardor, tanto quanto efêmero ou até imortal! Amo aquele cheiro de bosta que fica nos pastos verdes da fazenda, Amo a sinceridade do seu olhar, ditador da paz que me acalenta, Amo um abraço caloroso de amigo fiel; amo a fidelidade da amizade calorosa. Amo tudo aquilo que me transforma: o seu beijo, o seu tato, o humor, asco. Amo até aquela ruga, primogênita da silueta... Amo a infância que vivi, amo a infância que vivem, em cada nobre sorriso infantil de criança ingênua. Na verdade, amo tanta coisa que já nem sei mesmo se tudo isso que sinto é amor... Porém, qual problema maior me trariam, se já nem mais me encontram? Rodrigo Sluminsky +++ Etecetera http://www.jazzandblues.org/listen/

Resíduos

De tudo ficou um pouco. Do meu medo. Do teu asco. Dos gritos gagos. Da rosa ficou um pouco. Ficou um pouco de luz captada no chapéu. Nos olhos do rufião de ternura ficou um pouco (muito pouco). Pouco ficou deste pó de que teu branco sapato s e cobriu. Ficaram poucas roupas, poucos véus rotos pouco, pouco, muito pouco. Mas de tudo fica um pouco. Da ponte bombardeada, de duas folhas de grama, do maço― vazio ― de cigarros, ficou um pouco. Pois de tudo fica um pouco. Fica um pouco de teu queixo no queixo de tua filha. De teu áspero silêncio um pouco ficou, um pouco nos muros zangados, nas folhas, mudas, que sobem. Ficou um pouco de tudo no pires de porcelana, dragão partido, flor branca, ficou um pouco de ruga na vossa testa, retrato. Se de tudo fica um pouco, mas por que não ficaria um pouco de mim? no trem que leva ao norte, no barco, nos anúncios de jornal, um pouco de mim em Londres, um pouco de mim algures? na consoante? no poço? Um pouco fica oscilando na embocadura dos rios e os pei...

É o que dizem...

Dizem que há o tempo certo, o momento determinado, o dia especial. Coisa de idade! Dizem para estudar, trabalhar, madrugar, batalhar, correr. É o que dizem! Dizem também para comer beterraba com berinjela e carne de panela! Dizem ainda que vício é coisa do Diabo! Jesus salva! Dizem que pecar é ruim e que rezar é bom! Dizem que para tudo há o certo e há o errado. Certo ou Errado! Dizem para antes dizer : - oi! E para depois dizer: - tchau! Dizem que tem gente que não é bem gente. Dizem que tem amigo que não é bem amigo. Dizem, então, que as coisas são assim mesmo, complicadas! Dizem que é normal querer alguém que quer outro alguém! Dizem que sempre acontece ouvir um sim que não tem muito cara de sim! Dizem que acontece mais ouvir um não que quer mesmo dizer não! Dizem eles, enfim, que tem coisas que não se diz. Eu não digo nada! Sofro de alguns preconceitos vulgares mas pego a estrada! Prefiro andar, olhar, sentir, e pensar! Rodrigo Sluminsky +++ Etecetera Roda Viva , Chico Buarque